segunda-feira, 2 de maio de 2011

Lembranças...

"... E assim se foi a janela... E assim se foi o amor..."




Vocês já perceberam que o ônibus pode ser um ótimo meio para conduzir não só as pessoas aos lugares destinados mas também pôr em ordem muitos de seus pensamentos?

Gosto de andar de ônibus, certo que ao andar de carro o cômodo é maior e ainda podemos dormir sem ter a preocupação de passar da parada, mas chega um certo dia que quem já experimentou o ônibus vai sentir falta.


Uns sentem falta da lotação, daquele “empurra-empurra”, e até, acreditem se quiser, daquele cheiro incômodo. Eu sinto falta da janela. Da minha janela. Nela, eu tinha meu momento de organizar meus pensamentos. Ela estava sempre me esperando às doze horas e quinze minutos todos os dias, exceto sábado e domingo. Quando não conseguia sentar-me perto dela, esperava o mínimo gesto que indicasse que estaria na hora da pessoa, que ocupou meu lugar, sair. Então eu corria em direção a ela. Era feliz o momento!


Hoje, resolvi voltar a encontra-la. Passei certo tempo sem vê-la. Mesmo com o conforto do carro, senti falta e voltei. Ainda mais hoje, o dia em que eu precisava pôr em ordem meus pensamentos.


Mas, nesse dia, não era uma segunda-feira ou outro dia de semana como o de costume, e não estava no mesmo horário de sempre. Às treze horas, peguei o ônibus. Para a minha surpresa ele estava atrasado. Ainda bem, pois era nele que estava a minha janela!


Sentei. Por um momento me senti em conforto. Olhei para fora e avistei o céu azul de primavera. O sol sorria. Pode parecer clichê, mas no meu trajeto de volta para casa, até os pássaros cantavam. Meus olhos suavam.


Era comum ao olhar as nuvens, tentar lhes dar formas. Depois serviriam de porta para inicializar meus pensamentos. Mas, nesse dia nem tentei. Apenas olhei. De repente, pareciam passar como cenas de um filme. Até que uma me chamou atenção. Eram duas mãos. Duas mãos se acariciando. Uma se fechava sobre a outra procurando protege-la. A outra, protegida, apertava-lhe forte contra a palma aquela que lhe protegia, como se não quisesse sair dali.


Aquela imagem foi me fazendo lembrar de algo que eu muito sentia falta, algo familiar, mas que eu não sabia o que era. Suei mais. Foi então que as mãos deram origem a duas pessoas: um casal. Como era lindo seu abraço. Ela se encaixava formosamente nele enquanto ele a envolvia em seu corpo. Os olhos dela descansavam felizes, enquanto ele a beijava na testa e parecia dizer o quanto a amava. Ela sorria envergonhada e lançava alguma implicância para ele. Na verdade, essa implicância nada mais era do que um “te amo” que ela tanto queria falar e não conseguia. Suas mãos ainda estavam encaixadas. E a imagem ali congelara-se.


Eu assistia a tudo atenta. Quanto mais envolvente a cena ficava, crescia em mim uma angústia. Só a minha janela me entendia e assistia comigo aquela cena.


Na medida em que eu ia me aproximando de casa, os prédios teimavam em cobrir aquela cena, e quando isso acontecia, a cena parecia mudar o cenário, mas os personagens continuavam. Eu os já havia visto antes, mas onde? Também pareço conhecer essa história, essa cena não me era estranha. Mas por quê? Quem eram e porque mexiam tanto comigo?

Passou outro prédio, ou melhor, passei por outro prédio. Os dois estavam agora em uma praça. Ele deitado sobre o colo dela, olhavam o céu estrelado. O garoto para e olhar o céu e a contempla. A menina não gostava de ser observada, ele sabia disso, mas não resistia. As mãos continuavam entrelaçadas. Os olhos agora se fitavam. Mas a atração dos dois corações foi tão grande, que a solução foi tentar se aproximar. Para isso, os olhos se fecharam, os braços se entrelaçaram e os lábios se beijaram.

Mas passamos por outro prédio. E dessa vez a cena estava em uma escola. Essa escola também me era familiar, assim como a praça, o abraço, o beijo e as mãos. Mas quem eram? Por que me faziam suar daquele jeito? Minha janela não podia me dar tal resposta. Ela, também, assistia calada a tudo comigo. Essa parece ser a última cena. A mais dolorosa. Ela se baseava em um conjunto de outras cenas.


A primeira era em uma sala de aula. A menina parecia estar estressada, mas tudo nela se acalmava ao vê-lo. Ele a abraçava feliz, como se ela fosse peça chave naquela sua rotina. Em seguida iriam se sentar para assistirem à aula, dando origem à segunda cena. Nela, os dois corpos estavam virados pra frente, atentos à aula, mas seus corações estavam virados, brincando. Até que os corpos também viraram por instantes. Ele a olhava enquanto ela fazia um desenho de coração seguido de uma frase na cadeira dele. O garoto pegara, então, o livro dela e escrevera algo que ficaria gravado por todo sempre nela... Um pedido de casamento.

Nesse momento, percebi que não estava suando, e sim, chorando. Ela não respondera nada. Mas se ela tivesse dito sim, ele cumpriria sua promessa? Passa agora um vento, desfazendo parte daquela cena. Nessa nova cena, o garoto estava a entregar uma aliança à garota. Mas era estranho, ela não estava feliz. A cena então voltou à praça. Os dois estavam abraçados. Suas mãos estavam ainda encaixadas, mas a cena não continuou. As mãos, agora, deram origem a dois rostos. Finalmente poderia saber quem eram!


Procurei identificar rápido, outro prédio estava vindo destruir àquela cena. Finalmente descobri... Não posso acreditar! Todas as cenas agora passavam rapidamente como “flashes”. Os rostos eram sempre ressaltados. Na medida em que aumentava a rapidez com que as cenas se adiantavam em minha mente, aumentava também, uma certa agonia, falta de ar e disritmia. Fiquei dormente por alguns instantes. A cena congelou em minha mente. Olhei em minhas mãos e vi a mesma aliança que a garota das nuvens usava. Minha janela, agora, pôde me ajudar, mostrando no meu reflexo, o rosto da menina da história. Foi então que percebi que o garoto não havia presenteado à menina com a aliança, e sim, que a estava devolvendo. Sei disso por que era eu, ou melhor, sou eu aquela garota. Parei. Vi algo a mais em meu reflexo. Sangue... Será mesmo sangue? Escutei então gritos, logo após sirenes. Então percebi que nada mais podia ver. Senti alguém me pegar nos braços. Será ele que se arrependera e viera me salvar daquela dor agonizante? Mas e minha janela? Não queria deixa-la ali sozinha, ainda mais com aquele sangue... De quem era aquele sangue? Senti uma estranha vontade de dormir, mesmo sabendo que minha parada estava próxima. Não resisti, adormeci.


Acordei, estava tudo escuro. Só conseguia ouvir as vozes de meus pais. Eles vieram me buscar na parada? Mas por que estava tudo escuro? Meu amado, onde estava? Ainda sentia a presença da minha janela ali comigo. Então chegou mais alguém. Esse eu não conhecia, mas estava disposto a me esclarecer toda aquela situação. Falou-me que o sangue era meu. Aquele prédio que destruiria minha cena, na verdade, destruiu o ônibus em que eu estava. Eu não estava na parada, e sim, no hospital. Mas e minha janela? Por que sua presença ainda era tão forte? O médico, homem que havia me explicado tudo, explicou-me isso também. No momento do choque, eu estava encostada nela. Vendo minha tristeza, ela resolveu me abraçar, e no ímpeto de me proteger, penetrou profundamente em meus olhos. Eis o motivo da escuridão. Eram ataduras. Por isso ainda sentia minha janela ali comigo.


Aquela cena das mãos congelou em minha mente, ela havia sido o símbolo daquele meu amor. Naquela escuridão, momentânea ou não, era a única coisa que ficava visível. Quanto a minha janela, não precisaria me preocupar. Ela estaria guardada em meu corpo por algum tempo e pra sempre em minhas lembranças.



(Esse texto eu tive de fazer como uma redação que o colégio pediu, ou melhor, obrigou kkkkk. Tínhamos de fazer contos para participar do concurso de conto, redação e poesia... >< Boa leitura!! Espero que tenham gostado!^.^)


*Por: Ana Lieby"

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